O Executivo mineiro editou em 29 de dezembro de 2023, o Decreto nº 48.747, de 29/12/2023 regulamentou a chamada caução ambiental prevista na Política Estadual de Segurança de Barragens, instituída pela Lei 23.291, de 2019, mais conhecida como Lei Mar de lama nunca mais, legislação aprovada logo após a tragédia do rompimento da barragem da Vale em Brumadinho, e também motivada pelo anterior rompimento da barragem da Samarco em Mariana.
A lei em referência disciplina, especialmente, o licenciamento ambiental e a fiscalização de barragens de rejeitos ou resíduos industriais ou de mineração no Estado, de forma articulada com a política nacional de segurança de barragens.
A caução ambiental foi estabelecida na alínea “b” do inciso I e na alínea “b” do inciso III, ambos do art. 7º desta Lei, que estabelece exigências para o licenciamento ambiental de barragens. Para a obtenção da Licença Prévia (LP), o empreendedor deve apresentar uma proposta de caução ambiental, a ser estabelecida em regulamento, para que, nos casos de sinistro ou desativação da barragem, seja possível garantir a recuperação socioambiental da área.
Já para a obtenção de Licença de Operação (LO), o empreendedor deve comprovar que essa proposta de caução foi implementada, mediante a devida atualização.
O Decreto pode ser lido na íntegra através do link:
https://www.almg.gov.br/legislacao-mineira/texto/DEC/48747/2023/
O Decreto aplica-se às barragens constantes da Política Estadual de Segurança de Barragens, alcançando barragens de mineração, de acumulação ou destinação de rejeitos ou resíduos/líquidos industriais, ou barragens de água, que se apresentem pelo menos uma das seguintes características:
-Altura do maciço igual ou superior a 10 metros; capacidade total do reservatório maior ou igual a 1.000.000 m3; reservatório com produtos perigosos; potencial de dano ambiental médio ou alto.
A norma apresenta a fórmula-base para o cálculo referente ao valor da caução ambiental, que se dá pela multiplicação de vários parâmetros, e já se sabe qual o valor deve ser caucionado para cada empreendimento alcançado.
São ainda aspectos importantes da Caução os seguintes, constantes do Decreto:
A caução ambiental deve ser mantida durante toda a vida útil da barragem, desde sua instalação até a conclusão da descaracterização e da recuperação socioambiental da área impactada pela barragem;
A caução ambiental não substitui a obrigação do empreendedor de:
– promover a gestão de passivos ambientais decorrentes de atividades executadas no empreendimento; proceder à descaracterização da barragem; promover a recuperação socioambiental integral da área por ela ocupada ou atingida.
São modalidades de garantia para instituir a caução ambiental:
– depósito em dinheiro; Certificado de Depósito Bancário – CDB, fiança bancária; seguro-garantia.
O empreendedor poderá optar por uma ou mais modalidades de garantia para instituir a caução ambiental, que deve ser apresentada de forma individualizada para cada estrutura.
Uma audiência pública realizada dia 7/3/24 na Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais requerida pela Comissão de Administração Pública da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), expôs os pontos controversos do Decreto.
Conforme registro da reunião, participantes de audiência apontaram falhas no cálculo e alcance de mecanismo para assegurar recuperação socioambiental em caso de acidentes e no processo de desativação de barragens, e reclamaram da falta de discussão prévia e subdimensionamento de valores, resultante de cálculos feitos sem embasamento técnico mais amplo. Entre os inúmeros problemas, o mais grave, segundo afirmado na reunião, seria a fórmula de cálculo da caução, que consta de um anexo, pois ela teria se baseado apenas em uma tese de mestrado elaborada ainda em 2010 que, além de desatualizada, teria utilizado apenas projetos preliminares de fechamento de barragens
Representantes dos setor empresarial, assim como os ambientalistas que fizeram críticas na reunião, também criticaram o decreto, mas sob o argumento de que ele atrapalha investimentos e a geração de empregos.
Na outra ponta, os representantes do Executivo presentes na audiência defenderam o Decreto. A chefe de gabinete da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), Letícia Campos, negou que o decreto vá contra ou em paralelo à lei.
Segundo o superintendente de Política Minerária, Energética e Logística da Sede, Pedro Oliveira de Sena Batista, o modelo adotado de caução prioriza a liquidez.
O advogado Ricardo Carneiro , em evento da Comissão de Meio Ambiente da OAB/MG que tratou do tema caução ambiental afirmou:
“ A caução ambiental deve ser mantida durante toda a vida útil da barragem” .
Em sua fala, ele pontua que: “a vida útil de uma barragem pode ser de décadas, período em que o recurso da caução fica, via de regra, imobilizado para o empreendedor, e disse ainda que: “o seguro garantia tem uma exigência difícil de ser atendida, pois a apólice deverá ser emitida por companhia seguradora com rating em escala igual ou superior ao rating da União e com receitas de arrecadação de prêmios de seguro, no segmento danos e responsabilidades, superiores a R$ 6 bilhoes de reais, o que também torna difícil de se encontrar no mercado”.
Ele pontuou ainda as dificuldades do atendimento pelo mercado das demais modalidades de atendimento da caução.
Os empreendedores que possuam barragens em operação, desativadas ou em processo de descaracterização, deverão também apresentar a proposta de caução ambiental no âmbito do processo de licenciamento, com o respectivo cronograma de implementação, em até 180 dias a partir da publicação deste decreto
O grande desafio para os empreendedores será encontrar no mercado condições financeiras adequadas para atender a exigência da caução, conforme disposto atualmente no Decreto e observado ainda, outras necessidades de gestão empresarial da atividade, incluindo aí, investimentos diversos em expansão, em recuperação e obrigações ambientais, dentre outros.
Tema para o qual se recomenda nova rodada de reavaliação por parte do Estado quanto a efetividade do disposto nas regras do Decreto, que deve estar alinhado à Lei Mar de Lama nunca mais.