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Imagem: Polícia Civil / Divulgação

Dois anos do Caso Backer: justiça tardia não é justiça

Tragédia envolvendo contaminação da cerveja culminou em 42 pessoas intoxicadas, 11 mortes e nenhuma resposta concreta


Camila Dias

Notícias

Advogada especialista em Direito de Família - mediadora, conciliadora. Jornalista, especialista em Criminologia.


Dois anos do chamado Caso Backer, e nenhuma resposta concreta para os familiares das 42 pessoas intoxicadas, e destas, 11 morreram. O inquérito? Concluído há um ano e meio. Precatória vai, precatória vem. Ato ordinatório, conclusão para despachos, enfim. Idas e vindas intermináveis. E nenhuma resposta. Acusado morre no decurso processual e é extinta a punibilidade. Em outras palavras, o químico que respondia pelos homicídios, por óbvio, não responde mais. 

Hoje completam dois anos da instauração do inquérito que investigou a contaminação da cerveja artesanal. O veneno? Dietilenoglicol, cuja utilização na produção de gêneros alimentícios é proibida. Mas a substância era mais eficiente e, então, os responsáveis simplesmente não levaram a sério os riscos. Deveriam ter usado álcool etílico nos tanques de produção da cerveja, mas escolheram o di e o monoetilenoglicol. Assumiram o risco.

Há dois anos, familiares das vítimas da Backer aguardam a decisão por parte da Justiça Criminal. E ao que tudo indica, devem esperar por mais um longo período. A ação foi distribuída em janeiro de 2020. Em 08 de junho do mesmo ano o inquérito foi concluído. Três meses depois, em 08 de setembro, o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) ofereceu a denúncia. E dois anos após o primeiro resultado do exame de sangue que apontou para o veneno em uma das vítimas, as famílias continuam sem respostas.

 Os investigadores da Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG), direcionados pelo delegado que presidiu o inquérito, analisaram, estudaram e produziram os mais de 8 volumes que foram entregues à Justiça, com todas as provas que ninguém jamais havia coletado, indicando diretamente os responsáveis. Afinal, a morte de pessoas, por intoxicação com dietilenoglicol em cerveja foi algo inédito em nosso estado e, talvez, até no Brasil.

 Durante quanto tempo as famílias das vítimas da Backer continuarão aguardando respostas, tanto em âmbito cível, como criminal? Os processos andam a passos de lesma, cujas movimentações se resumem em precatórias e mandados que vão de um lado para o outro.

 Em consulta ao site do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), por meio do número do processo criminal (é que há outro em tramitação em âmbito cível), percebe-se que, em 27 de outubro do ano passado, houve a movimentação que concluiu para julgamento. E depois disso? Mandado vai, mandado vem. Conclui-se para despacho e mais mandados. Em que pese hoje ser 05 de janeiro, a última movimentação está datada de 10/01/2022 - “proferido despacho vista MP”. Uai, mas o MP está em recesso. A Justiça está em recesso desde o dia 20 de dezembro de 2021. Ah, sim, o sistema colocou a data automaticamente, sem informar para o leigo que o MP só deve de fato “dar vistas ao processo” na semana que vem.

Situações como essas, inerentes à Justiça brasileira, podem explicar o motivo da demora, mas sabemos que vai muito além. Alguns dirão que a demora está relacionada ao número de vítimas. Não justifica. Todas morreram pelo mesmo veneno, jorrado no tanque de produção por irresponsabilidade, imperícia, descaso dos produtores e donos da empresa.

 O resultado disso das idas e vindas? A certeza da impunidade e a multiplicação da dor dos que perderam seus entes queridos. Como bem explicou Marcelo Cunha de Araújo, autor da obra “Só fica preso quem quer”, o sistema de punição brasileiro é seletivo — ricos permanecem soltos e os pobres, presos. Quem tem dinheiro paga advogados caríssimos, que conhecem todos os caminhos e atalhos. Atrelada a isso está a legislação. Não é necessário ser um exímio operador do direito para entender o quanto a legislação brasileira tem beneficiado aqueles que escolhem estar à margem do que é correto.

Como ensinou o brilhante jurista Ruy Barbosa: “Justiça atrasada não é Justiça, senão injustiça qualificada e manifesta. Porque a dilação ilegal nas mãos do julgador contraria o direito das partes e, assim, as lesa no patrimônio, honra e liberdade".

Pessoas morreram. Outras que sobreviveram carregarão as sequelas pelo resto da vida. E quanto aos responsáveis por tudo isso? Ah, os responsáveis têm dinheiro para usar de todos os recursos existentes na (in)Justiça brasileira. 

* Esta coluna tem caráter opinativo e não reflete o posicionamento do grupo.
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