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Imagem: Valter Campanato/Agência Brasil

O verdadeiro objetivo do contra-golpe

Não estou dizendo que esse é o objetivo do poder judiciário, mas com certeza é o objetivo do PT


Augusto de Franco

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Augusto de Franco, analista político, é autor do livro Como as democracias nascem


Qual é mesmo o objetivo político de toda essa operação contra-golpe? Se for tirar da vida pública Bolsonaro e seus 36 golpistas, concluído o devido processo legal, tudo bem. Os democratas apoiamos, embora o número dos que, na época, aprovavam uma intervenção militar seja muito maior.

Se for levar em conta não apenas os que cogitaram o golpe, o planejaram e iniciaram sua execução, mas também os que veriam com bons olhos a iniciativa, teremos que implantar um PACP - Programa de Aceleração de Construção de Presídios.

No entanto, desconfia-se que não é esse o objetivo. Bolsonaro já inelegível (sem anistia) e, depois, condenado e preso, não é mais uma ameaça. Ameaça não, claro, de golpe contra a democracia (posto que não há a menor condição disso acontecer) e sim eleitoral, de eventualmente apoiar um candidato na próxima eleição.

Então é necessário também impedir que os aliados de Bolsonaro (com seu apoio como martir encarcerado) possam concorrer com chances de desafiar a continuidade do PT no governo. Eis a grande ameaça.

O processo contra Bolsonaro e quase quatro dezenas de bolsonaristas tem que atingir gente que tem voto e que não se pode provar que participou de alguma trama golpista, como Tarcísio de Freitas, Romeu Zema, Ronaldo Caiado, Ratinho Júnior e até, quem sabe, algum expoente do "centrão" ou do centro político (como Gilberto Kassab ou Baleia Rossi).

Uma sombra de suspeição tem de pairar sobre a cabeça de quem desafia o PT eleitoralmente, retirando-lhe legitimidade. Se eles se associaram a Bolsonaro ou não o denunciaram a tempo e se Bolsonaro é golpista e assassino, então eles também seriam, no mínimo, coniventes com golpe de Estado e assassinato. A militância lulopetista fará a festa dizendo que eles queriam matar Lula, depois de prendê-lo injustamente.

Evidentemente, os golpistas bolsonaristas devem responder pelos seus crimes. Mas essa é uma tarefa da polícia, do ministério público e da justiça e não da política, na medida em que a ameaça de golpe de Estado não existe mais na atualidade. Tratar o assunto como se a ameaça fosse atual e esticar os processos judiciais com o fito de colher vantagens eleitorais em 2026 é a pior coisa que  se pode fazer agora. Significa investir, por mais dois anos, na polarização tóxica que está dilacerando a sociedade brasileira.

O "perigo" que o bolsonarismo representa, no curto prazo, é apenas o de seus próceres, antigos ou novos, vencerem as próximas eleições. Mas tirar o PT do poder pelo voto, em eleições limpas, não é golpe de Estado: faz parte do jogo democrático. Tentar impedir isso com artimanhas político-judiciais, restringindo direitos políticos e liberdades civis (como a liberdade de expressão: aparelhando os meios de comunicação profissionais e praticando censura prévia nas mídias sociais), terá como efeito inevitável acelerar um processo de autocratização do nosso regime político.

Sim, o perigo não vem só pela direita.

* Esta coluna tem caráter opinativo e não reflete o posicionamento do grupo.
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