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Sobre o nosso jornalismo amestrado


Augusto de Franco

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Augusto de Franco, analista político, é autor do livro Como as democracias nascem


Um jornalista amestrado falando em certo canal de TV. "Puxa, que coisa! O apagão tirou poucos votos de Nunes". Esse pessoal perdeu completamente a vergonha e a responsabilidade. Não têm a menor ideia do que estão fazendo. Estão desacreditando uma das instituições fundamentais da democracia.

Os jornalistas amestrados disseram que o X ia minguar, pois as pessoas adeririam a outras mídias sociais (como o BlueSky e o Threads) durante a quarentena imposta por Alexandre de Moraes. Não aconteceu nada disso. A maioria voltou ao X "com gosto de gás" logo que o bloqueio acabou.

Jornalistas amestrados agora dizem que a posição do PT – ao reconhecer a eleição fraudulenta do ditador Maduro como legítima – nada tem a ver com a posição de Lula e do governo – o que é falso: bastaria refazer uma linha do tempo, desde que Lula recebeu o ditador com tapete vermelho no Palácio do Planalto em 2023; ou melhor, antes, desde que Lula assumiu a presidência pela primeira vez em 2003. E ficam então catando exemplos de alguns poucos parlamentares petistas que, por convicção ou oportunismo, criticam o alinhamento do PT ao governo da Venezuela, sem registrar que a maioria dos dirigentes e militantes do PT estão perfeitamente de acordo com a posição oficial do partido.

O jornalismo amestrado que emerge nesta terceira década do século 21 no Brasil não é exatamente igual ao puxa-saquismo do passado. Não é que alguns meios de comunicação comerciais, por razões econômicas (para receber verbas de propaganda governamental e patrocínio estatal), apoiem o governo de turno. Não! Estamos assistindo a outro fenômeno, muito mais perigoso. É que agora alguns veículos tradicionais – sobretudo canais de TV a cabo – fazem parte, organicamente, do sistema de governança oficial. Transformaram-se em um dos players da coalizão tácita “PT-Governo-STF-TV” que o partido que quer ser hegemônico e articulou para passar o fato de que é minoria (quase) em todo lugar: nos parlamentos e governos municipais e estaduais, no Congresso Nacional, nas mídias sociais, nas ruas e nas urnas.

Para que não reste dúvidas. O que chamo de jornalismo amestrado é o jornalismo chapa-branca, quase uma assessoria de imprensa oficiosa, composta por profissionais que abandonaram sua independência e seu espírito crítico para servir ao PT, ao governo e ao seu líder máximo.

Fazem crônicas da corte, favoráveis à situação, no lugar de jornalismo.

São porta-vozes, recebendo orientações por zap enquanto estão ao vivo (o que é inédito, além de escandaloso).

Torcem, sem a menor cerimônia, por candidatos apoiados por Lula e lamentam que seus adversários não estejam perdendo votos em razão de catástrofes naturais sobre as quais não poderiam ter controle.

Não são mais jornalistas e sim propagandistas, agentes políticos em luta para emplacar versões oficiais. Transformaram-se, sem sentir, na escória de uma profissão honrosa, que deveria continuar sendo exaltada pelos serviços prestados ao longo da nossa história.

As consequências desse comportamento serão desastrosas, não apenas para eles, os jornalistas amestrados, mas para a democracia.

A imprensa livre, não-reprimida, mas também não-tutelada, é uma das instituições fundamentais da democracia. Mas vá-se lá dizer-lhes!

* Esta coluna tem caráter opinativo e não reflete o posicionamento do grupo.
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