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Imagem: Foto: Robson de Oliveira

Manifestações de fé no Caminho Velho

Rota guarda tradições seculares que dão vida ao folclore mineiro


Daniel Magalhães Junqueira

Entretenimento

Coluna de Turismo assinada por Daniel Magalhães Junqueira - Presidente do Instituto Estrada Real


Na cidade de menos de 10 mil habitantes na Trilha dos Inconfidentes, um festejo que guarda semelhanças com as festas do Bumba meu Boi, comuns no nordeste brasileiro, toma conta das ruas entre dezembro e janeiro. O cavaquinho e a viola acompanham o coro que entoa músicas como “Vem cá meu Boi”. Sanfonas, tambores e chocalhos também podem acompanhar os cortejos, formados pelo Boi Mofado, um toureiro, uma nega maluca e uma mulinha. Os moradores também costumam comparecer fantasiados, como uma prévia do carnaval, que marca o fim da festa. A celebração tem origem europeia, com raízes que remontam a sátiras às touradas comuns na Península Ibérica. 

Mais ao sul, em Baependi (MG), no Circuito das Águas, uma personagem do início do século XIX é a figura central de uma peregrinação que acontece geralmente em junho. Nhá Chica, filha de ex-escravos, tinha uma fé tão inquestionável em Nossa Senhora da Conceição que logo pessoas de toda a região a visitavam em busca de curas e ajuda espiritual. Em vida, muitos a consideravam uma santa. Em 2012, o Vaticano a beatificou diante do reconhecimento de um dos seus milagres: a cura, sem intervenção médica, de um problema congênito grave no coração de uma professora da região. Hoje, uma multidão com velas acesas toma conta das ruas em junho em homenagem a Nhá Chica. Quadros vivos encenam passagens da vida da beata e as casas decoradas completam o cenário.

A religiosidade atravessa os limites de Minas Gerais pelo Caminho Velho e se manifesta também em cidades como Cunha e Paraty, respectivamente no estado de São Paulo e Rio de Janeiro, ao fim dessa rota real. Ali, umas das celebrações mais marcantes é a Festa do Divino, que, no Dia de Pentecostes (50 dias após a Páscoa), celebra o Espírito Santo, terceira pessoa da Santíssima Trindade. Exatamente como a Rainha Isabel fez há 700 anos, carne é distribuída para os pobres na alvorada do último sábado da festa. Os portugueses chamavam esse ato devotos ao Divino. Há também a coroação de um adolescente da comunidade como Imperador, que recebe homenagens como apresentações da Dança das Fitas e do Xiba Cateretê.

Em outros vilarejos, crenças católicas se misturam a tradições africanas, por ser uma região que abrigou grande parte dos escravos trazidos para o Brasil a partir do fim do século XVII.

Uma das heranças africanas mais marcantes é o Congado, que se espalha por várias cidades do Caminho Velho, especialmente em Minas Gerais, estado com o maior número de guardas de congado do país, essa devoção a Nossa Senhora do Rosário, acompanhada em geral de uma coroação simbólica do rei do Congo, é cantada e dançada no Brasil desde 1715, quando chegou ao povoado de Cachoeira do Campo, atual distrito de Ouro Preto. É no mês de agosto que essa celebração toma conta, até hoje, das ruas desse povoado e de muitos outros, como Caxambu, no Circuito das Águas.

Em Guaratinguetá (SP) é a celebração de São Benedito que enfeita a cidade. No período escravocrata, os grandes fazendeiros se reuniam para celebrar o domingo de páscoa e ordenavam que os escravos desfilassem com seus cavalos para expor suas riquezas. Enquanto o faziam, os escravos silenciosamente festejavam São Benedito, o santo negro. No dia seguinte, os serviçais ganhavam folga. Foi assim que nasceu a festa que até hoje começa com a cavalgada no domingo de páscoa. Procissão, missa, distribuição de doces e congados completam a celebração.

As tradições do Caminho Velho não se encerram nas celebrações religiosas. A força cultural do trajeto também se manifesta na autenticidade da arte simples e encantadora produzida pelas mãos calejadas dos moradores. Um dos ícones dessas manifestações artísticas é o povoado de Bichinho, distrito de Prados.

A maioria das suas casas, datadas em maior parte do século XVIII, foram transformadas em oficinas, ateliês e lojas de artesanato. Móveis, telas, bordados, tapetes, crochês, esculturas e adornos nascem de todo tipo de material. De plástico a ferroe madeira de demolição, tudo vira matéria-prima nas mãos desses artistas anônimos que transformaram a vila em um dos principais centros de artesanato de Minas Gerais.

O caminho Velho guarda tradições seculares, que dão autenticidade a rota, que marca o folclore nascido nas zonas rurais e nos pequenos vilarejos, criando tradições culturais peculiares. Visite a Estrada Real: Uma estrada, seu destino! 


* Esta coluna tem caráter opinativo e não reflete o posicionamento do grupo.
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